sábado, 25 de dezembro de 2010

Sobre presentes e festas

Eu tenho um amigo português que é um cara estranho. Eu gosto dele, mas ele tem o prazer masoquista de se esforçar para não ser gostado. Dentre as coisas que fazem com que ele quase não seja gostado, está o fato dele odiar as festas de fim de ano. E não pensem vocês que ele é um rebelde sem causa que curte ser do contra e odiar tudo aquilo que o restante da população adora: Pedro REALMENTE se deprime quando as cidades começam a dar os primeiros sinais de que, logo, as ruas estarão iluminadas. Ele tem seus motivos.
No ano passado, eu vivi meu primeiro natal longe de casa, exatamente em Portugal, quando conheci Pedro. Foi tudo muito bonito. Eu e a Isa jantamos num hotel maravilhoso, com a família de nossa amiga brasileira que, coincidentemente, estava lá também. Após a ceia, fomos a uma casa de dança folclórica, rodopiarmos ao som de uma sanfoneira incrível. No dia do nascimento de Cristo - ou de Newton -, com essa mesma família, almoçamos em outro hotel maravilhoso numa cidadezinha chamada Amarante, onde, posteriormente, fizemos a nossa digestão caminhando pela rota do rio. Dias antes do natal, fomos aos chineses para comprarmos os enfeites da casa, já que o chinês queridíssimo que nos hospedava, não tinha tempo para tais caprichos. Compramos uma arvorezinha, colares verde-amarelo para decorá-la e um enfeite de porta que nos custou o equivalente a um real e trinta centavos. Foram cenas de filme europeu! Uma coisa bela, cult e ao mesmo tempo tão simples que beirou o bobo. Foi delicioso.
E, então, chegou esse ano. Eu estava empolgada com as festas. Desempacotamos os enfeites guardados, decoramos a casa toda - mais do que em qualquer ano anterior - e eu até arrumei um emprego no shopping para que, pela primeira vez, eu pudesse comprar presentes com um dinheiro gerado por mim! Tudo como planejado. Tudo saindo bem demais! E o dia tão esperado chegou. Seis horas da tarde foi quando as portas das lojas se fecharam e eu sai berrando pelo estoque que estávamos todos livres para a comemoração do Natal. 
Cheguei em casa cansada. Deitei, dormi um pouco e acordei. As coisas já começaram a não fazer sentido quando eu não conseguia escolher uma roupa pra noite e nem gostar das combinações que minha mãe insistia em perguntar se estavam boas. Porém, nos ajeitamos e ficamos bem bonitinhas! Presentes, sobremesa e pessoas no carro com destino à casa da amiga da minha tia. "Festa estranha com gente esquisita. Eu não tô legal..." Acontece que meus pais são separados, minha família é muito dividida e, na ceia, a gente sempre acaba jantando e convivendo com pessoas que não são tão próximas. A sensação de acolhimento e carinho é geral, mas sabe quando não é a mesma coisa? E foi assim que meu natal começou a ruir, quando, jogada numa poltrona pelo meu cansaço da labuta, me dei conta de que todo aquele marketing natalino não se aplicava à minha realidade.
Na verdade, desde que minha família deu uma segregada - uns no Japão, outros no Paraná, em São Paulo... - meu Natal passou a significar ganhar presentes legais! Porém, naquela noite, nem isso me animou, porque no amigo secreto, quem me tirou foi uma mocinha que nunca tinha me visto na vida e, pelo desconhecimento e total falta de criatividade, ela me deu um creme para mãos. Logo, enquanto meu irmão se distraía com seu livro de quadrinhos, eu pensava no quanto o natal estava me deprimindo, no quanto um creme para mãos era um presente tosco, no quanto eu estava cansada demais para participar da discussão sobre política e no quanto a vida não fazia sentido algum. Mas a noite acabou e eu fiquei na esperança de que o dia seguinte fosse ser melhor.
Vinte e cinco de Dezembro e eu ouço meu pai chegar munido de sacolas. O celular toca, tenho uma conversa matinal com a Isa, tomo um banho e parto para a melhor parte do dia: a troca de presentes. Meu pai vai primeiro e, ainda que eu não tenha pedido nada, ganho tudo o que eu queria! Entrego os presentes que comprei a eles e eles ficam felizes! Oba...? Sentimento de plenitude que sempre me perseguiu quando eu ganhava/dava presentes... CADÊ VOCÊ? Bom, resta-me ainda o almoço com a família do meu pai.
A pequena família que a princípio totalizava dez pessoas se faz nove, porque meu avô faleceu há um ano e meio. E hoje se fez oito, porque minha avó quis ficar na casa dela. Seu gato está muito doente e ela não quis deixá-lo sozinho. Resultado: eu e minha prima passamos duas horas de nossa tarde natalina no veterinário. E, por incrível que pareça, a máxima do sentimento de união aconteceu nesse pequeno período em que as três, temerosas pelo gatinho, compartilhávamos olhares compreensivos.
Ao final do dia, num segundo momento de comemoração - qual, né? - fomos à casa de uns amigos da família, jantarmos e, como é de praxe, cantarmos no videokê do dono da casa. Acontece que, novamente, jogada na cadeira pelo cansaço do dia inusitado, aquela sensação de "nada faz sentido" recaiu sobre a minha pessoa e eu acho que conheci a sensação do suicida quando decide pelo seu fim. É um sentimento tão grandiosamente bizarro que ainda que eu tentasse expressá-lo não seria suficiente. Não que eu tenha elaborado meu fim por causa disso, mas agora eu sei como é. E isso tudo me faz pensar naquele meu amigo do começo desse desabafo que, acometido por, acredito eu, um sentimento tão profundo de falta de sentido, odeia com todas as suas forças o natal e tudo o que ele representa.
E o que era pra ser uma crônica, acabou virando crônico.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

A dor de não ser

Às vezes - quase sempre - a minha dor maior é a de não ser. Aquilo que sou eu posso organizar e adaptar, mas aquilo que me falta é impossível de ganhar consistência. O não-ser se torna uma coisa mole e repugnante. Escapa por entre os dedos e mancha o meu abdômen de puro enjôo. E então o não-ser ocupa a minha fome e a minha vontade de mostrar quem sou. Encolhe as minhas pétalas e me faz botão. A dificuldade do outro em aceitar o amor, em enxergar o amor, para mim, é algo inexplicável. Sinto que essa cegueira se veste com a lente do preconceito e desfila por aí como se usasse a grife mais famosa do universo. Sonho com o dia em que a moda será a paz e o amor. E não precisa nem andar pelado e pintar no rosto uma flor. As coisas, quando se bastam por si, não precisam de representação, elas simplesmente são. E eu estou cansada de sofrer por não ser...